Aula INAUGURAL DO GESTAR II








CONFRATERNIZAÇÕES DO GESTAR II



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FOTOS ALEATÓRIAS




RELATÓRIOS DAS TPS TRABALHADAS










Relatório da TP2

No TP2, que trata da Análise Linguística e Análise Literária fora estudado então (Gramática: Seus Vários Sentidos, A Frase e Sua Organização, A Arte: Formas e Função e Linguagem Figurada). Uma das discussões mais eloquente foi a questão da gramática interna porque até então a maioria dos cursistas não haviam ouvido falar sobre ela, e a descoberta de sua existência gerou um certo desconforto e vários pontos de interrogação no que diz respeito ao fato de considerar ou não a forma como os alunos falam ou escrevem determinadas palavras.... se deve ou não ser levado em conta.
Estas dúvidas instigaram uma pesquisa mais profunda sobre o assunto e apimentou a discussão no grupo, pois todos até então só levavam em conta a gramática normativa.
Quanto a Frase e sua organização, percebi que não houve muita mudança no que estão acostumados a trabalhar, mas estudamos as várias formas lingüísticas de estruturar o texto das mais simples às mais complexas para que possamos compreender e usar essas estruturas com os alunos. As atividades propostas no Avançando na Prática foram muito comentadas.
Fora trabalhado também as várias formas de artes que nos cercam, não somente o belo mas também suas formas e funções, quais sua importância no nosso dia á dia e como caracterizá – la. Bem como a Linguagem Figurada que geralmente é vista através do prisma literário através das figuras de linguagem.

Todas as oficinas foram trabalhadas através do Power point elaborados pelos cursistas e apresentadas em datashow e mediada por mim com algumas complementações e, vale lembrar em tempo que todo o material produzido nos grupos eram repassados para os demais para serem aplicados em sala..




RELATÓRIO DA TP1


Já na TP1, seguindo a mesma metodologia trabalhamos Linguagem e Cultura (Variantes Linguísticas:Dialetos e Registros, Variantes Linguísticas: Desfazendo Equívocos, O Texto Centro das Experiências no Ensino da Língua, A Intertextualidade), as atividades foram desenvolvidas com responsabilidade, apresentei os vídeos:Chico Bento no Shopping, Preconceito Linguístico e outros para o grupo, e também muita descontração principalmente quando se falava em variantes linguísticas, normas e uso da língua buscando compreender como essas variantes se efetivam em nossa interação cotidiana, a própria conceituação de texto e suas implicações no ensino-aprendizagem da língua e a intertextualidade o que gerou uma discussão muito boa, pois neste momento os cursistas empolgaram e queriam falar todos ao mesmo tempo.
É preciso se levar em consideração os conhecimentos prévios da língua trabalhando de forma eficaz o conhecimento e a compreensão sobre a realidade histórica, social e cultural a norma culta.
A intertextualidade também gerou muita discussão porque alguém sempre se lembrava de outro texto ou imagem que dava para trabalhar com os alunos.








Relatório da TP6

Após os relatos das atividades desenvolvidas n TP5 com os cursistas passamos então às atividades do TP6 e continuamos com a metodologia trabalhada no TP5. Os cursistas se dividiram em dupla ou em trio e fizemos tudo novamente cada um com uma unidade...
Percebi que a leitura coletiva e as discussões também propiciaram o crescimento de muitos cursistas que estavam em sala pela primeira vez no ano; Mas o ápice das discussões era o fato de eles perceberem o que tinha dado certo em suas aulas e o que tinha dado errado e o por quê; E ainda na troca de experiência o professor que havia aplicado uma determinada atividade em uma turma e o outro a mesma em outra puderam analisar como as turmas se comportam em relação a aplicação das atividades.
No TP6 que trabalha Leitura e Processos da Escrita II (Argumentação e Linguagem, Produção Textual: Planejamento e Escrita, O Processo de Produção Textual: Revisão e Edição, Literatura para Adolescentes) sugere que a leitura seja um momento de busca pela satisfação e prazer de ler. É claro que nem tudo na vida é prazeroso e a leitura pode ser torturante quando não é bem direcionada. Mas os professores têm buscando formas de tornar a prática de leitura de livros literários um momento diferente, criativo, prazeroso e que tenha efeitos questionadores e reflexivos. Muitos pesquisaram nas bibliotecas escolares e nas municipais livros que pudessem aguçar a curiosidade dos alunos para que os mesmo viessem a praticar o ato de ler.
Esta Tp foi muito gostosa de ser trabalhada pois as aplicações das atividades em sala aguçaram a criatividade dos cursistas há muito adormecida, liberando a imaginação e principalmente o espírito de criança em fazer arte através de pequenos escretes, peças de teatro, declamação de poesias e muita mas muitas produções textuais principalmente a propaganda(argumentação).













RELATÓRIO DA TP5


Ao observar que a metodologia utilizada nas oficinas anteriores estava tornando – se cansativa e menos atraente, resolvi mudá–la. No primeiro momento, desenvolvi com os cursistas uma atividade que para muitos era novidade, e brincamos muito com as palavras e as imagens. No segundo momento, pensei em fazer a oficina em forma de seminários; Fiz a proposta e que foi prontamente aceita.
Propus então que em duplas ou em trios de acordo com o número de cursistas os mesmos estudassem e preparassem teoricamente as unidades do Tp5 -Estilo, Coerência e Coesão- (Estilística, Coerência Textual, Coesão Textual, Relações lógicas no texto), para expor aos demais grupos e propondo uma nova forma de aplicação dos Avançando na Prática e assim provocar a discussão das mesmas.
Minha surpresa maior foi o rendimento desta proposta, pois partimos para os trabalhos jogando os estudos em Power paint para serem apresentadas em datashow, e percebi que uma grande maioria não dominava as TICs e demonstravam medo de aproximarem da máquina; Ensinei os primeiros passos e deixei que eles dessem asas a suas imaginações.
Os primeiros slides produzidos ficaram muito interessantes, porque os cursistas usaram todos os recursos possíveis e cabíveis e se divertiam a cada um que movimentava de forma inesperada.
Aprenderam também fazer busca na internet usando – a como ferramenta na utilização de recursos, principalmente no Google as imagens para colocarem em seus slides e então passaram para a produção das atividades da TP.
A troca de experiências a cada encontro tornava - se o carro chefe do Gestar, pois todos queriam apresentar o que tinham desenvolvido com seus alunos, pontos positivos e negativos das atividades, e tudo o mais.
Desta forma, os cursistas mostraram – se motivados com as atividades e solicitaram que as demais fossem trabalhadas da mesma forma, isto é, todos trabalhando todas as oficinas não só impares ou pares.

O GRITO QUE FAZ NASCER A MANHÃ

Lucília Maria Sousa Romão - Universidade de Ribeirão Preto


Durante o mês de abril de 2004, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem

Terra (MST) iniciou uma série de ocupações, manifestações e atos públicos, cobrando do governo Lula agilidade na reforma agrária, medidas contra o desemprego e mudanças na política econômica. A divulgação do “abril vermelho” e a representação do ato de gritar abriram um novo capítulo do litígio discursivo em relação à reforma agrária; posições-sujeito entram em rota de colisão, convulsionadas pela ideologia e pelos sentidos que se constroem sob o signo da memória e da sua atualização.

A partir de recortes colhidos sem jornais impressos e eletrônicos, pretendo interpretar como o ato de gritar e sua interdição significa e como as representações de líder popular e de presidente derivam de posições em relação ao poder constituído, datadas pela conjuntura sócio-histórica, cuja materialidade é lingüística e histórica.

Durante el mes de abril de 2004, el Movimiento de los Trabajadores Rurales sin Tierra (MST) inició una serie de ocupaciones, manifestaciones y actos públicos, reclamando del gobierno agilidad en la reforma agraria, medidas contra el desempleo y cambios en la política económica. La divulgación del“abril rojo” y la representación del acto de gritar abrieron un nuevo capítulo del litigio discursivo en relación con la reforma agraria; posiciones sujeto entran en ruta de colisión, convulsionadas por la ideología y por los sentidos que se construyen bajo el signo de la memoria y de su actualización. Apartir de recortes de periódicos impresos y electrónicos, pretendo interpretar qué significan el acto de gritar y su interdicción y cómo las representaciones de líder popular y de presidente derivan de posiciones en relación con el poder constituido, datadas por la coyuntura sócio histórica, cuya materialidades lingüística e histórica. “Um galo sozinho não tece uma manhã: / ele precisará sempre de outros galos. / De um que apanhe esse grito que ele/ e o lance a outro; de um outro galo/ que apanhe o grito que um galo antes/ e o lance a outro; e de outros galos / que com muitos outros galos se cruzem/ os fios de sol de seus gritos de galo, / para que a manhã, desde uma teia tênue, / vá se tecendo, entre todos os galos.” João Cabral de Melo Neto aflora a coletiva tecelagem de gritos de galos, que, sob a cadência da manhã ainda escura, anunciam o sol e a claridão emergentes.

Os gritos Rev. Brasileira de Lingüística Aplicada, 238 v. 5, n. 1, 2005de galo, como as mobilizações populares, anunciam e constituem o raiar da manhã com rede de possibilidades e mudanças, que virão-a-ser. Na certeza de que os sentidos e os atos de linguagem não brotam no sujeito como água na pedra, mas se constituem na/pela teia do interdiscurso, é possível dizer que os gritos desenham, no tecido da memória nacional, uma trama mais que presente: índios e negros gemeram seus gritos de indignação frente ao extermínio lento da senzala e da escravidão; imigrantes gritaram sua inserção nas lavouras e fábricas; camponeses, estudantes e mulheres afiaram o estribilho dos seus gritos em prol de direitos sonegados; torturados ensangüentaram quartéis com seus gritos de dor, enquanto, sob cifradas senhas, poetas cantaram seus gritos de rebeldia.

O grito “Diretas-Já”, em 1984, interrompia um itinerário sombrio de anos de chumbo. A plena pulmões, operários disseram palavras de ordem em sindicatos com gritos que fizeram estremecer as fábricas e “Lula-lá” nada mais foi do que um grito de esperança a vibrar na garganta dos operários. A partir dos anos 80, o país assiste ao nascimento do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) como um coro de vozes que dá visibilidade aos párias do campo e busca forçar a entrada da reforma agrária na agenda nacional, recuperando os sentidos já ditos por outros movimentos de luta pela terra, a saber:

Quilombos, Ibicaba, Canudos, Contestado e Ligas Camponesas (ROMÃO, 2002). A memória discursiva se atualiza, ancorada nos efeitos de justiça social, dívida histórica, mobilização dos excluídos e grito, pois para a população que teve a sua cidadania adiada desde o berço e que apenas é tratada como consumidora no circuito dado pelo capitalismo, resta a voz. Do fundo do atoleiro-pântano da miséria e da injustiça social, faz eco o grito com as mesmas feições de pânico e horror que modelaram o rosto da personagem de Edward Munch. As pinceladas de assombro da obra pictórica se transmutam em gritos de indignação diante da barbárie constituída pela fome, exclusão da terra e desemprego.

Do museu, o personagem do expressionismo alemão salta a olhar para os habitantes da periferia e grita o seu assombro. Na tela e na vida real, gritar é estratégia de se manter vivo, de amealhar visibilidade, de tornar-se presente, de se inscrever no lugar da memória que sempre foi marginalizado pela classe dominante, de se fazer ouvir com aquilo que restou, ou melhor, com a última ferramenta que, do homem, lhe é própria e indomável: a voz. Rev. Brasileira de Lingüística Aplicada, v. 5, n.1, 2005 239. Assim, há, no ato de gritar, a memória discursiva, que faz funcionar os efeitos de indignação, resistência, luta e insubordinação ao poder constituído e que se materializa na língua, materialidade exemplar do litígio político e do confronto entre sujeitos com desiguais poderes, pois como Orlandi (1996, p. 138) aponta, é preciso levar em conta “o lugar social dos interlocutores e a desigualdade na distribuição dos conhecimentos”. Os estudos da Análise do Discurso (AD) de matriz francesa, desenvolvidos a partir dos trabalhos de Pêcheux e Fuchs (1975), primam em postular que o sujeito não é livre nem fonte originária de seu dizer, mas uma posição discursiva dentro de uma conjuntura sócio histórica, datada por contradições de classes, posição essa construída pela/

na filiação à teia da memória, dos sentidos já-ditos e/ou naturalizados,permitidos ou interditados para o lugar que o sujeito ocupa.Voltando à rede histórica de gritos de galo, é possível dizer que ela entretece o nascer da manhã-Brasil, recolhendo no ar o clamor de um país desejoso de liberdade, justiça social e democracia para todos.

Foi também uma somatória de protestos e mobilizações gritadas que constituiu (e ainda constitui) a trajetória do presidente Luis Inácio Lula da Silva, cuja biografia foi escrita com a voz rouca de tanto gritar ordem sem palanques improvisados em cima de peruas kombi. Desde cedo, Lula bem aprendeu que, sem grito, não sairia do nordeste pobre e não chegaria a São Paulo. No lugar de militante, percebeu que sem o megafone da causa operária e sem os gritos coletivos de seus iguais, não se tornaria emblemática presença diante dos patrões. A corda vocal calejada acordava outras cordas, como galo rouco de tanto chamar o nascimento da manhã.

Na inscrição discursiva de líder operário, o sentido de protesto, ação coletiva, luta política, reivindicação eram legítimos, pois a ideologia os fazia parecer evidentes, possíveis e adequados. O lugar de onde ele enunciava era socialmente marcado por uma posição de classe compatível com o grito e com o ato de gritar. O protesto coletivo era peça de legalidade, legitimidade e ação estratégica. Alinhados a esses sentidos naturalizados para o sujeito na posição de líder sindical, vários movimentos

populares fizeram funcionar essa zona da memória do gritar com o metáfora de indignação, luta e resistência. O “Grito dos Excluídos”, por exemplo, é um grande ato sempre realizado no dia 7 de setembro em várias capitais do país e que tem na Cidade de Aparecida (SP) a sua expressão mais forte. Lá, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil Rev. Brasileira de Lingüística Aplicada, 240 v. 5, n. 1, 2005

(CNBB), pastorais sociais e diversos setores da Igreja, intelectuais e representantes dos movimentos sociais fazem um grande ato político e engordam a fila da romaria dos trabalhadores. Reproduzo a seguir os princípios norteadores desse grito, escritos por Pe. Luiz Bassegio e Pe. Alfredo Gonçalves, ambos da Coordenação do Grito dos Excluídos no Brasil, que materializam as representações imaginárias que o ato de gritar evoca: O Grito dos Excluídos não é um evento localizado no tempo e no espaço. Trata-se, antes, de um conjunto de atividades que convergem para uma determinada data de mobilização geral: o chamado “dia do Grito”. Este, no Brasil, ocorre a 7 de setembro; na América Latina, a 12de outubro. (...) No Brasil, o Grito dos Excluídos tem início em 1995. Na América Latina, pela primeira vez, em 1999. (...) Chega-se, assim, ao Grito propriamente dito. O que é? Antes de tudo, uma dor secular e sufocada que se levanta do chão. Dor que se transforma em protesto, cria asas e se lança no ar. De ponta a ponta do país ou do continente, o povo solta ao vento o seu clamor, longamente silencioso e silenciado. É um grito que ganha os ares, entra pelas portas e janelas, toma os espaços. Tem como objetivo unificar todos os gritos presos em milhões de gargantas, desinstalarem os acomodados, ferir os ouvidos dos responsáveis pela exclusão e conclamar todos à organização e à luta.

É o grito dos empobrecidos, dos indefesos, dos pequenos, dos sem vez e sem voz, dos enfraquecidos – numa palavra, o grito dos excluídos! Em consonância com esse grito dos excluídos, ao sujeito no lugar de líder sindical era permitida a denúncia do capital concentrado pelas multinacionais; era possível a narrativa sobre a falta de horizontes dos trabalhadores esmagados na linha de montagem; era legítimo lutar por aumento de salário, por direito de greve e por paralisação como forma de luta política. Também se materializava a equação simbólica entre o gritar, a quantidade de gritantes e o poder de fogo diante de negociações com o capital instituído dentro e fora das fábricas. Depois de algumas tentativas inglórias, Lula chega ao cargo de primeiro mandatário do país. Tal fato é analisado como acontecimento discursivo por Indursky (2003, p. 110), posto que apresenta uma forte ruptura com as representações de presidente aceitas e construídas ao longo da história e memória nacionais:1Textodisponívelnaíntegranapágina unecity.es/conjuntos/libertad/15/excluidos.htmRev. Brasileira de Lingüística Aplicada, v. 5, n.1, 2005 241 Assistíamos a algo ainda não presenciado anteriormente, a algo ainda não nomeado na cena política brasileira. (...) um país que tinha sido sempre governado por bacharéis, por doutores ou militares, presidentes que representavam as oligarquias deste país, que representavam uma minoria dominante. E esta ruptura colocava, pela primeira vez, nesses500 anos de história, na Presidência da República Federativa do Brasil, um filho do povo, um presidente sem instrução formal, que não possui nenhum diploma universitário, que atropela a língua em sua modalidade culta, que não fala nenhuma língua estrangeira, enfim, um operário, um

torneiro mecânico que tem, na mão esquerda, apenas quatro dedos,marcando, dessa forma, indelevelmente, sua origem operária. E mais: um nordestino, que, longe de ser rico, é um retirante que migrou em um pau de arara para São Paulo e que passou fome. E, culminando tudo isto, um líder sindical, organizador de greves memoráveis que afrontaram a ditadura militar e que foi preso por desafiar a lei anti-greve então vigente no país, ditadura que veio justamente para “proteger o país do

perigo vermelho, do comunismo”. Um homem que se chama apenas Silva.(...) E esta ruptura certamente produz um acontecimento discursivo (...)Realmente, na posse, o vermelho se estendeu do vestido da primeira-dama às esplanadas dos ministérios, ruas e espaços público sem um espocar de estrelas cheias de esperança. Brasília ouviu a base dos gritos populares como uma explosão histórica de trabalhadores,

operários, sem-terra, desempregados, que se viam representar no lugar de Lula e na voz de um presidente que se constituiu por sentidos contestatórios, rebeldes e socialistas em uma história pessoal de resistência e tenacidade. Eleitores e simpatizantes, vindos de todos os cantos do país, fincaram a bandeira do PT no núcleo decisório da política nacional como re-presença de ruptura e sentidos novos, quiçá estrelados. Mas os tempos são outros, é certo. Passado o primeiro ano de lua de - mel com o poder, MST e movimentos populares potencializam críticas à política econômica e à reforma agrária do governo adormecida pela cantilena da demora e dos parcos investimentos sociais. Durante o mês de abril de 2004, marchas, atos públicos e ocupações deram relevo à Jornada de Luta do MST, que a grande mídia batizou de “abril vermelho”;mais de 140 ocupações pipocaram em estados do Nordeste, Centro-sul e Sudeste, colocando publicamente gritos ritmados pelos acordes de insatisfação e reivindicação, o que discursivamente provocou a reatualização dos mesmos sentidos e do mesmo lugar que constituíram Lula como líder sindical e articulador de massas. Nessa/dessa posição de gritante, João Pedro Stedile enunciou que Rev. Brasileira de Lingüística Aplicada, 242 v. 5, n. 1, 2005

O Abril Vermelho não é um roteiro de ocupações e invasões de terra,mas sim um movimento de mobilizações organizadas e que contará também com a participação de outras entidades da sociedade civil (...)é preciso aproveitar este primeiro de abril para envermelhar o Brasil.É preciso que os movimentos de massa ganhem novo ânimo e volte màs ruas para discutir um modelo alternativo para este país. O que nós queremos é aproveitar o mês de abril para preparar um grande primeiro de maio. Vamos partir para as estradas. Nem que seja em passeatas, calados, quietos em protesto contra o capital. Em entrevista concedida a jornalistas, em Três Lagoas (MG), o presidente comenta a declaração acima, afirmando que a reforma agrária não vai ser feita no grito dos trabalhadores ou no grito dos que são contra. Ela vai ser feita respeitando a legislação vigente e no clima de harmonia que norteia o comportamento de meu governo. Ao afirmar que a reforma agrária não “será feita no grito”, Lula enuncia de um outro lugar, que não aquele do qual o sindicalista falava.

Provoca uma ruptura com os sentidos que edificaram sua trajetória,interditando os sentidos nos quais sempre se alocou para traçar a sua cartografia discursiva e política. Na posição de presidente, alinhado pela ideologia ao poder dominante, certos sentidos são interditados, proibidos e/ou indesejáveis, tidos como inconvenientes, tornando-se necessário silenciá-los. Esse efeito de evidência e naturalização é o trabalho da ideologia, que interpela o sujeito em sujeito do discurso e recorta para ele um sentido como único possível de ser dito, como o mais seguro e transparente. Sobre tal conceito tão caro à Análise do Discurso, Tfouni (2003, p. 154) afirma que:(...) a ideologia decorre do estado da luta de classes em conflito uma com a outra, e um processo de apagamento/identificação do sujeito de/com um ou outro lugar dentro dessa luta, o que vai determinar as seqüências produzidas/esquecidas pelo sujeito. Assim, temos que a desigualdade, produto da luta de classes, está inscrita na língua (...)Tendo postulado que é na pele da língua que se marca a inscrição dos lugares-sujeito derivados da luta de classes, é possível dizer que2 Site Último segundo, http://ultimosegundo.ig.com.br/useg/brasil/artigo/0,,1566258,00.html (31 de março de 2004)3 Folha de S. Paulo, A 11, dia 4 de abril de 2004Rev. Brasileira de Lingüística Aplicada, v. 5, n.1, 2005 243‘aquele que grita’ é deslocado do lugar legítimo de protesto e reivindicação, silenciado como um outro que se opõe à “harmonia do meu governo”, desarrumando uma suposta ordem e desestruturando

aquilo que estaria seguramente controlado. O grito, inflamado peloexcesso e pelo descontrole do gritante, desarticularia a paz social,assegurada pela legislação e pelo aparato democrático do governo doPartido dos Trabalhadores (PT). Silencia-se aqui a equação simbólicade que a harmonia seria vitimada pelo ato de gritar. O imaginário, quecoloca o presidente no lugar daquele que tem autorização parasentenciar sobre a reforma agrária, é o mesmo que o faz elaborar o atode gritar de outra forma, como interdição e silenciamento.Ao negar o grito, o sujeito no lugar de presidente sinaliza umaregião tranqüila, quiçá consensual para a realização da reforma agrária,como se desapropriar latifúndios fosse sinônimo de prática marcada

por negociação amigável, até harmônica. Tensão zero, diferenças deformações ideológicas zero, luta de classes zero! O efeito decordialidade representa o governo que, cheio de boas intenções, farianaturalmente a distribuição de terra no país como a promover umevento social entre amigos e não entre gritantes. Assim, aquele que gritacava temores e tremores em áreas como a estabilidade econômica, agovernabilidade, a ausência de riscos, “a harmonia do meu governo”,enfim. Na sombra do depoimento de Lula, está construído um lugar decalma, paciência e espera, que se confronta com os sentidos já-ditos sobreo(s) grito(s) e o ato de gritar que o constituíram ao longo da luta sindical.Em direção oposta ao motor da memória das mobilizaçõeshistóricas, já narradas neste artigo, e na contramão da história do

presidente, o sujeito aqui promove a emergência e o florescimento dapassividade, recortando uma região da memória que faz circular outrossentidos possíveis, a saber: a ineficácia de gritar, a afronta dos gritos ea inutilidade da voz exaltada no coletivo, quiçá sua ilegitimidade. Nãose trata de avaliar ou julgar o governo em questão, mas interpretar olugar de onde Lula enuncia, sua migração de uma formação discursivapara outra, a interdição de alguns sentidos, o processo de interpelaçãoideológica em dois lugares diferentes e a zona da memória acionada

pelo sujeito antes líder de massa, agora líder do governo.Reforço aqui que o sentido é entendido como efeito, pois aspalavras não têm um valor referencial em si mesmas e só podem serinterpretadas a partir de condições de produção determinadas por

Rev. Brasileira de Lingüística Aplicada, 244 v. 5, n. 1, 2005relações de poder e pela luta de classes e significadas pela historicidade.Conforme Orlandi (1996, p. 160): “Como o texto é um espaço, mas umespaço simbólico, ele não é fechado em si mesmo: tem relação como contexto e com os outros textos”.Ainda na materialidade lingüística, a seqüência, na qual o sujeitofaz sentido, “no grito dos trabalhadores ou no grito dos que são contra”,funciona de modo a emparelhar e apontar semelhanças entre o gritoe o gritar de trabalhadores e ruralistas. O enunciado faz funcionar oefeito de igualar, não marcar diferenças e pasteurizar regiões desiguaisde poder como se elas fossem afins; e, ao assemelhar os diferentes edesiguais, promove-se o discurso soberano e vitorioso da ordem e dalei, cujo efeito é justamente tratar todos os cidadãos como se elesfossem iguais e tivessem os mesmos direitos e deveres. Ora, sabe-semuito bem que os sentidos e os poderes não são distribuídos demaneira homogênea. Portanto, a tentativa de processar qualquerconsenso entre sem-terras e ruralistas sabota as desigualdades, silenciaa dialética em que senhores e escravos se movem, significam (-se) eescrevem sentidos. No fundo, tal retórica infantiliza a questão políticada reforma agrária.Para o sujeito-presidente, o grito dos excluídos, construído na/pelas tramas do interdiscurso, se desloca da região de luta e reivindicação,deixa de ser narrado como estratégia coletiva e passa a ser um genérico,o grito de qualquer um e de todo mundo, inclusive dos ruralistas, quediscursivamente sempre se alinharam à manutenção de privilégios eposses e que, diga-se de passagem, nada grita(ra)m por mudançassociais ao longo da história do país, a não ser aquelas que aumentavamo rol de seus privilégios.Desse modo, Lula se coloca no papel do mediador sensato, neutro,que preserva e cultua os ideários da democracia e da Lei, a despeitode quaisquer gritos. É preciso dizer que, em vários períodos da histórianacional, sob a cifra do apelo à legalidade, à força legal e à manutençãoda ordem, processou-se uma estratégia de apagamento dos movimentossociais. Falar em ordem, progresso, harmonia e paz social re-configura

essa rede de sentidos, que faz avançar o banimento do grito daquelesque (teimaram) e teimam em clamar por mudanças na estrutura depoder, deslegitimando-os e narrando-os como desordeiros, criminosos,bagunceiros ou loucos, para, por fim, endossar a sua prisão (ROMÃO,2002, 2003; ROMÃO e TFOUNI, 2002) . Aplicada, v. 5, n.1, 2005 245Os lugares de sindicalista e presidente se movem determinadospelo nebuloso jogo das relações de poder e afetados pela filiação aregiões da memória discursiva. É certo que os sujeitos são e estãosujeitos aos sentidos que a ideologia lhes permite enxergar e enunciar,e isso direciona o que eles podem e devem dizer em consonância como poder constituído e/ou em sintonia com os gritos, que racham frestasno mesmo poder. Também é possível sentenciar que não existe umaregularidade lógica e controlável para o sujeito, pois antes o grito, agoraa negação do gritar.Mais importante do que a cor do mês de abril é interpretar omovimento de sentidos, posições e discursos, diante do e no poder,cuja materialidade lingüística e histórica foi interpretada nosdepoimentos do líder do MST e do presidente da República. Na orlaem que a materialidade da língua e da história se tocam, é possívelobservar que o sujeito sempre enuncia do lugar marcado socialmentee que a ideologia autoriza ou interdita sentidos para o sujeitoconstituído na/pela teia da memória. No caso, memória de gritos degalos que sempre anunciam a manhã e que, no caso, tecempossibilidades ou interdições para o amanhã.

Referências

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